O protetor solar não interfere com a produção de vitamina D

Um debate voltou a se intensificar nas redes sociais, desta vez sobre o uso de protetor solar. A discussão começou quando Tim Spector, professor de epidemiologia genética no King's College London, expressou preocupação de que o uso diário de protetor solar pudesse levar à deficiência de vitamina D.

Embora a publicação de Spector tenha causado bastante comoção, não é a primeira vez que argumentos semelhantes contra o protetor solar surgem nas redes sociais — há muitas publicações discutindo o assunto. A maioria dessas preocupações se concentra no fato de que o protetor solar bloqueia a radiação ultravioleta (UV), necessária para sintetizar a vitamina D na pele. Felizmente, pesquisas sugerem que isso provavelmente não é um problema para a maioria das pessoas.

A vitamina D é um nutriente essencial. Ela ajuda a regular a absorção de cálcio, importante para a saúde óssea. Um crescente corpo de pesquisas também sugere que a vitamina D pode ser importante para outros aspectos da saúde, incluindo o fortalecimento da imunidade, a redução da inflamação e a manutenção da saúde cardíaca. No entanto, mais pesquisas são necessárias para confirmar essas descobertas.

Embora possamos obter vitamina D de certos alimentos, como peixes gordurosos, gemas de ovo e laticínios fortificados, nossos corpos dependem principalmente da luz solar para produzi-la na pele.

Quando somos expostos à radiação ultravioleta B (UVB), uma série de processos ocorre em nossas células da pele que convertem uma molécula semelhante ao colesterol em vitamina D3.

Como a produção de vitamina D requer exposição à radiação UVB, é razoável supor que o uso de protetor solar interfira na síntese de vitamina D.

O protetor solar atua como um filtro, absorvendo ou refletindo a radiação UV do sol. Quanto maior o fator de proteção solar (FPS) de um produto, melhor ele protege contra queimaduras solares (causadas principalmente pela radiação UVB). Ao impedir que essa radiação atinja e cause mutação no DNA das células da pele, os protetores solares podem reduzir o risco de câncer de pele. Também foi demonstrado que os protetores solares reduzem o envelhecimento da pele induzido pela radiação UV.

No entanto, os protetores solares não oferecem 100% de proteção, principalmente porque a maioria das pessoas não os usa conforme as instruções. As pessoas normalmente aplicam apenas cerca de um quarto a um terço da quantidade de protetor solar necessária e raramente o reaplicam conforme as instruções. Isso significa que parte da radiação UVB ainda atinge a superfície da pele.

Protetor solar e vitamina D

Muitos estudos analisaram os efeitos do uso de protetor solar nos níveis de vitamina D. No geral, os resultados mostram que, com o uso regular, o protetor solar ainda permite a produção de quantidades adequadas de vitamina D.

Em um estudo conduzido por nossa equipe de pesquisa, realizamos um experimento de uma semana com 40 turistas em Tenerife, Espanha. Os participantes aprenderam como aplicar corretamente o protetor solar FPS 15 para proteger a pele.

O protetor solar não apenas protegeu os participantes das queimaduras solares, como também melhorou seus níveis de vitamina D. Isso mostrou que, mesmo com protetor solar, radiação UVB suficiente ainda atinge a pele para produzir vitamina D.

Essas descobertas são consistentes com duas revisões que também analisaram o uso de protetor solar no mundo real e os níveis de vitamina D.

A maioria dos estudos incluídos nessas revisões relatou que o uso de protetor solar não afetou os níveis de vitamina D ou que seu uso resultou em aumento dos níveis de vitamina D. Isso foi especialmente verdadeiro para estudos de campo, que refletiram melhor o uso de protetor solar e a exposição solar em cenários do mundo real.

No entanto, essas revisões também encontraram vários estudos experimentais (com condições mais controladas) que mostraram que o uso de protetor solar pode impedir a síntese de vitamina D. No entanto, esses estudos usaram fontes de UV que não são representativas da radiação UV solar, o que pode limitar sua relevância para descobertas no mundo real.

Outra limitação dos estudos analisados nestas revisões foi que a maioria utilizou protetores solares com FPS baixo (em torno de 15 ou menos). As recomendações de saúde pública sugerem o uso de protetor solar com FPS de pelo menos 30, o que pode ter um efeito inibidor mais forte na produção de vitamina D.

E a maioria desses estudos incluiu apenas participantes brancos. A pele branca contém menos melanina, que atua como um protetor solar natural, protegendo contra danos UV (incluindo queimaduras solares).

A melanina também pode ter um pequeno efeito inibitório na produção de vitamina D. Estudos observacionais mostram consistentemente que pessoas de pele escura tendem a ter níveis mais baixos de vitamina D do que pessoas de pele clara que vivem na mesma latitude. Essa diferença se torna ainda mais pronunciada em latitudes mais altas, onde os níveis de radiação UVB são mais baixos.

Uma revisão também constatou que pessoas com pele mais clara produzem mais vitamina D. No entanto, essa diferença provavelmente se deve a diferenças na metodologia dos estudos incluídos na revisão. Alguns utilizaram fontes de luz artificial que não representam a radiação UV do sol e podem produzir resultados não representativos.

Mais pesquisas são necessárias, incluindo pessoas com pele mais escura e que usem protetores solares com FPS mais alto. Mas, com base nos dados disponíveis, o uso típico de protetor solar não interfere na produção de vitamina D. Ele também tem o benefício adicional de prevenir a radiação UV prejudicial.

Considerando que pessoas com pele mais escura correm maior risco de deficiência de vitamina D, passar mais tempo ao sol pode ser benéfico. No entanto, embora pessoas com pele mais escura tenham um risco de câncer de pele de 20 a 60 vezes menor do que pessoas com pele mais clara, ainda é importante evitar o sol quando ele está mais forte e usar protetor solar ou se cobrir se estiver ao ar livre em dias ensolarados.